O acordo de
delação premiada assinado pelo ex-ministro
Antonio Palocci com a Polícia Federal,
revelado ontem pelo GLOBO, é uma
reunião de fatos que envolvem, em grande parte, o
esquema de arrecadação do PT com
empreiteiras citadas
na Lava-Jato e a atuação dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff nos
crimes apurados pela operação. Por se tratar de uma colaboração
negociada na primeira instância, os temas abordados pelo ex-ministro
dizem respeito a fatos investigados — ou passíveis de investigação —
pela 13ª Vara Federal de Curitiba, comandada pelo juiz Sergio Moro, que
terá o papel de homologar o acordo.
Palocci está preso em Curitiba desde setembro de 2016.
Ele foi condenado por Moro a 12 anos, dois meses e 20 dias de prisão
pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Nas últimas
semanas, além de fixar as bases dos benefícios concedidos ao ex-ministro
— ainda sob sigilo —, os investigadores concluíram a fase de
depoimentos. O acordo estaria na fase de homologação por Moro, o que
deve acontecer em até duas semanas.
O GLOBO apurou ontem que boa parte das histórias abordadas por
Palocci — que ainda poderão ser detalhadas no curso das investigações —
reconstitui o esquema de corrupção na Petrobras, as relações das
empreiteiras com políticos do PT e a forma como Lula e Dilma se
envolveram nas tratativas que resultaram em um prejuízo de cerca de R$
42 bilhões aos cofres da estatal, segundo estimativa da própria PF.
Durante o processo de delação, Palocci também poderá apresentar anexos
suplementares com novos casos considerados relevantes pelos
investigadores.
LULA E DILMA NEGAM ACUSAÇÕES
Ao falar de Lula, Palocci detalhou ocasiões em que foi pessoalmente
levar pacotes de dinheiro vivo ao ex-presidente e relacionou datas e
valores entregues por um de seus principais assessores, Branislav
Kontic, na sede do Instituto Lula. Segundo Palocci, os pagamentos a
Lula, feitos nos últimos meses de 2010, quando ele se preparava para
deixar o Planalto, chegavam a somar R$ 50 mil. Dinheiro que seria usado
pelo ex-presidente para bancar despesas pessoais.
Na ocasião das entregas, relata o ex-ministro, ele e Lula combinavam o
local de encontro para o pagamento. Como o ex-ministro não dirigia o
próprio carro, costumava levar um auxiliar ao volante que agora, na
delação, poderá ser chamado a testemunhar sobre o caso. Além do
assessor, cuja identidade é mantida em sigilo, Palocci listou datas e
horários das entregas de dinheiro a Lula como parte do conteúdo
probatório. A partir dessas informações, investigadores teriam condições
de atestar encontros, por meio de ligações telefônicas entre Lula e
Palocci, e pela posição dos aparelhos celulares no mapa de antenas.
Ao falar da relação de Lula com empreiteiras, o ex-ministro disse que
parte do dinheiro entregue nas mãos do ex-presidente e na sede do
instituto teria saído diretamente da “conta Amigo”, a reserva de propina
atribuída ao petista no Departamento de Operações Estruturadas da
Odebrecht. Já ao citar Dilma, Palocci afirmou aos investigadores que ela
teria atuado para atrapalhar as investigações da Lava-Jato no episódio
da nomeação de Lula para ministro da Casa Civil, em março de 2016.
CONVERSA NO PLANALTO
O ex-ministro narrou ainda pelo menos uma conversa com Lula no
Palácio do Planalto na qual teria tratado do esquema envolvendo a
construção de sondas para exploração de petróleo em águas profundas. O
objetivo da negociação, feita na presença de Dilma, seria levantar
dinheiro para bancar a eleição da ex-presidente, em 2010.
Em nota divulgada ontem, Dilma afirmou que “o ex-ministro mente para
sair da cadeia e não tem provas para sustentar acusações a ela ou Lula”.
Advogado de Lula, Cristiano Zanin negou envolvimento de seu cliente nos fatos narrados:
— Qualquer afirmação de entrega de dinheiro ao ex-presidente Lula é
mentirosa e, por isso mesmo, desacompanhada de qualquer prova. Lula
jamais pediu ou recebeu vantagens indevidas.
Em nota, o PT afirmou que Palocci “rendeu-se às chantagens da
Lava-Jato” e faz “falsas acusações” contra Lula para receber benefícios.
Além de detalhar os casos de corrupção dos quais participou ou teve
conhecimento, o ex-ministro terá de apresentar provas do que diz. Se
mentir ou quebrar algumas das cláusulas firmadas, poderá perder os
benefícios negociados. Não está claro se Palocci irá apresentar anexos
tratando dos casos de corrupção envolvendo clientes de sua consultoria, a
Projeto. Também não há sinal de que ele irá citar casos que estão fora
da jurisdição de Moro, como o caso dos pagamentos de propina pela
J&F ao PT e fatos relacionados a antigas campanhas eleitorais do
partido.
Fundador do PT, ex-prefeito de Ribeirão Preto, ex-ministro da Fazenda
do governo Lula e ex-chefe da Casa Civil de Dilma, Palocci participou
das decisões mais importantes do partido nas últimas duas décadas. O PT
sempre negou irregularidades nas doações de campanha do partido.