26 de agosto de 2014

Pena por uso indevido de música em campanha é de até 4 anos

Orientação mais adequada para compositores que se sentirem lesados por alguma utilização indevida é procurar a Justiça

Sanches: “O que a lei assegura é que cabe indenização pelo uso sem autorização”. Foto: Divulgação
Sanches: “O que a lei assegura é que cabe indenização pelo uso sem autorização”. Foto: Divulgação
Pena de dois a quatro anos de reclusão, indenização por dano moral e material, além de pedido de providências junto ao Tribunal Regional Eleitoral. Essas são as sanções às quais estão sujeitos aqueles que violam direitos autorais. A campanha do candidato ao Governo do Estado, Robinson Faria(PSD) está sendo acusada de usar sem autorização a música “Cometa Mambembe” como jingle. O compositor da música, Carlos Pitta, deve acionar a campanha do candidato na Justiça.
Quem aponta as possíveis penas é o advogado carioca Sydney Limeira Sanches, assessor jurídico da União Brasileira de Compositores e um dos mais respeitados especialistas em direitos autorais do país. Segundo Sydney Sanches, a orientação mais adequada para compositores que se sentirem lesados por alguma utilização indevida é procurar a Justiça. “Existem vários mecanismos legais para se coibir esse tipo de ação. O que a lei assegura é que cabe indenização pelo uso sem autorização, além de uma ação penal. O código penal trata como crime esse tipo de situação”, diz o advogado.
O artigo do código penal em questão é o 184, que diz que “se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor” a pena é de dois a quatro anos. “Não é um método muito utilizado nesses tipos de caso, mas é possível entrar com uma ação penal”, explica Sydney Limeira.
O primeiro passo é impedir que a reprodução da música sem autorização do autor tenha continuidade. Nesse caso, o compositor deve pedir à Justiça a imediata proibição da reprodução da música através de uma liminar. Depois, cabe pedido de indenização por danos morais. “Ninguém é obrigado a atrelar a sua imagem a um político, a uma campanha, independente das convicções políticas de cada um”, explica Sydney.
Cabe também um pedido de indenização por dano material, pelo uso em si da música. A Justiça irá decidir pelo valor da indenização de acordo com o valor médio cobrado pela cessão de direitos de uma música para servir de jingle político. “Existe um mercado específico para isso e por analogia os valores utilizados nesse mercado são usados como parâmentro. Mas o valor da indenização não é o mesmo do valor de mercado. A indenização precisa ser maior do que o valor cobrado pelo uso regular. O juiz às vezes decide por dobrar, triplicar ou quadruplicar a depender da extensão do dano”, compara.
Como se trata de uma eleição, os compositores que se sentiram prejudicados podem acionar ainda o Tribunal Regional Eleitoral ou o Tribunal Superior Eleitoral. “Uma das regras básicas para concorrer a qualquer cargo público, seja do legislativo ou do executivo, é respeitar as leis do país”, diz Sydney. E complementa: “A reprodução da música pode ser proibida por qualquer meio, desde o audiovisual e a internet até aqueles locutores em carro de som anunciando o candidato com o jingle como fundo musical”.
De acordo com o assessor jurídico da UBC, não é mais comum ver esse tipo de uso indevido de músicas em campanhas majoritárias. O caso de Robinson Faria e a música de Carlos Pitta, “Cometa Mambembe”, é uma exceção. “Pelo tamanho do Brasil, um país continental, é comum acontecer isso em época de eleição. Mas em campanhas menores. Não é comum ver em uma campanha para o Governo do Estado, porque os candidatos e quem cuida desse tipo de campanha estão acostumados com esse trâmite e costumam ser cuidadosos, conhecem a lei”, relata.
Além do caso de Carlos Pitta, Roberto Carlos e Beto Guedes tiveram no atual período eleitoral problemas com candidatos por uso de músicas sem autorização.
Entenda o caso
Cometa Mambembe foi composta em 1983 e se transformou num sucesso com o cantor alagoano Carlos Moura, conquistando mais de 60 regravações desde então. Bandas como Araketu, Chiclete com Banana e Banda Eva, além de Luiz Caldas, regravaram a canção.
A música é uma mistura de frevo e arrastapé, com influência de Luiz Gonzaga e compositores pernambucanos como Capiba e Duda do Frevo. “Essa música teve exibição no Fantástico e passou mais de cinco anos como a mais tocada do carnaval de Salvador. É talvez uma das poucas músicas compostas na Bahia que toca no carnaval de Pernambuco”, conta Carlos Pitta.
No primeiro programa de campanha de Robinson Faria, a música composta por Carlos Pitta e Edmundo Caroso é o pano de fundo de um clipe onde o candidato cumprimenta pessoas nas ruas. A letra original (“E tenha fé no azul que tá no frevo que o azul é a cor da alegria, um cavalo mambembe sem relevo, um galope de Olinda pra Bahia”) é modificada para conter o discurso do candidato (“tenha fé na força do vermelho, que o vermelho é a cor da alegria, e o Rio Grande do Norte unido e forte com a força de Robinson Faria”).
De acordo com informações repassadas para a reportagem, o uso indevido já foi caracterizado e a campanha de Robinson será acionada na Justiça, já que, para o compositor, houve dano à sua obra e apropriação da música. “Isso é uma invasão de propriedade. É uma propriedade autoral nossa e eles não poderiam nunca fazer isso. Essa música tem compositores, tem uma editora, então tem uma representatividade. Essa música não é domínio público”, diz Carlos Pitta.
Segundo Carlos Pitta, ele não foi consultado para que o jingle fosse usado por campanha alguma. “Eu não aceito paródia nenhuma da minha música e muito menos paródia para campanha política. Isso é uma falta de respeito, não autorizei em nenhum momento e nem o meu parceiro autorizou absolutamente nada”, reclama.
O cantor baiano acredita que a utilização deturpou a sua obra. “Existe um elo sagrado entre mim e as minhas composições. Ninguém pode deturpar uma obra artística, você não pode deturpar um quadro de Picasso, por exemplo. É preciso ter respeito pela criação”, lamenta.

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